quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Plano de negócios não resolve tudo

Lucas Bertolotti

Existe uma boa razão para que A Beleza da Ação Indireta — Por Que a Linha Reta nem Sempre É a Melhor Estratégia, do economista inglês John Kay, mereça a atenção dos pequenos e médios empresários se o livro não diz o que fazer para achar a estrada para o crescimento? Sim, e a razão é exatamente essa: a ausência de receitas fáceis que leva à reflexão cada vez que se vira a página.

Kay, um ex-professor da London Business School e da Universidade de Oxford que hoje escreve semanalmente uma coluna no jornal Financial Times, destrói uma ilusão comum entre empreendedores — a de que, para uma empresa dar certo, basta fazer um bom plano de negócios e executá-lo direito. Não é que ele seja contra o planejamento.

O problema é que, ao não dar o devido valor às incertezas, gerações de empreendedores e executivos têm subestimado a importância de manter a flexibilidade para rever os planos diante do inesperado.

Em seu livro, Kay diz que sobram evidências de que não existe planejamento, por mais detalhado que seja, capaz de dimensionar corretamente o peso de fatores sobre os quais não se pode ter controle. Aliás, muitas vezes não dá nem para ter certeza se acaso algum aspecto muito importante acabou ficando de fora.
   
Kay está convencido de que os casos em que atiramos no que vemos e acertamos o que não vemos são a regra, e não a exceção. Por isso, diz ele, seria mais sensato que as decisões de negócios fossem tomadas mais por métodos que ele chama de "oblíquos" (que incorporam as incertezas conforme elas se tornam menos incertas) do que por métodos "diretos" (aqueles em que determinada meta, vinculada a uma estratégia lógica e cuidadosa, é perseguida com obstinação).

"Em geral, abordagens oblíquas aproveitam melhor o aprendizado imprevisível, e rico, que provém da busca pelos objetivos", escreve Kay. "É preciso olhar para trás e enxergar as descobertas, antes invisíveis, para então seguir adiante."
  
Frequentemente, na abordagem oblíqua, para chegar a determinado lugar deve-se seguir por algum caminho que, em certos trechos, vai numa direção diferente da que levaria ao destino.
É uma ideia paradoxal, mas com o aval da realidade — batalhas decisivas na história das guerras, por exemplo, incluíram táticas diversionistas para enganar o inimigo e logística complexa para superar obstáculos geográficos. Assim, diz Kay, também é no mundo dos negócios. 

No livro, o autor fornece exemplos de contraste entre a abordagem oblíqua e a direta. Ele conta que no começo da década de 90 costumava afirmar em suas aulas na London Business School que o domínio da Boeing no setor de aviação a tornava umas das empresas mais potentes do mundo.
Como a Boeing chegara àquela posição? Quando lhe perguntavam qual objetivo a empresa perseguia, Bill Allen, que presidiu a Boeing entre 1945 e 1968, dava uma resposta muito diferente de "aumentar o valor da empresa para os acionistas" — uma das metas mais prometidas, cobradas e pouco compreendidas nas últimas décadas.

Ele dizia: "Eu e meus executivos somos guiados pelo espírito de comer, respirar e dormir o mundo da aeronáutica". Em sua gestão foram desenvolvidos o Boeing 737 e o Jumbo 747, dois dos modelos mais bem-sucedidos da história da aviação e que ajudaram a levar a Boeing à liderança do mercado da aviação comercial. 

No final dos anos 90, depois da aquisição da rival McDonnell Douglas, a cultura decisória havia mudado — ou, pelo menos, o discurso havia mudado. O presidente, Phil Condit, declarou que, a partir dali, a estratégia  seria concentrar-se em baixos custos para aumentar os retornos sobre os investimentos e, assim, o valor para os acionistas.


Investimentos de alto risco foram redirecionados para projetos do Exército americano que envolviam riscos mais baixos. Ficou decidido então que os altos executivos seriam transferidos de Seattle para Chicago por ser mais perto de Washington, de onde proviam os fundos do governo.

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