A Procter & Gamble, multinacional americana dona de marcas como Ariel, Hipoglós e Gillette, divulgou no fim de abril queda de 3,6% nos lucros do primeiro trimestre do ano. Foram US$ 2,61 bilhões contra US$ 2,71 bilhões do início de 2008. A retração aconteceu, segundo a própria companhia, porque o consumidor preferiu produtos mais baratos. Isso porque, em vários países, a desvalorização das moedas frente ao dólar fez encarecer o portfólio da P&G. Seria de se esperar que isso também acontecesse no Brasil. Mas aqui, houve o contrário. A companhia não só conseguiu aumentar as vendas, como também ganhou mercado em todas as categorias em que atua, segundo Tarek Farahat, presidente da P&G Brasil.
"Desde o início da crise, no ano passado, passamos a enfatizar em nossa comunicação com o consumidor o quanto nossos produtos compensam mais que os da concorrência", diz o executivo. Para as pilhas Duracell, por exemplo, a empresa reforçou a ideia de que, mesmo com preço 25% superior, elas "duram oito vezes mais".
O mesmo aconteceu com outros produtos da empresa, como as fraldas Pampers Noturna. "Elas custam mais caro. São 10 centavos a mais por fralda em comparação com o concorrente. Mas, em compensação, duram a noite toda. Com elas, a mãe não precisa levantar no meio da noite para trocar a fralda do bebê", diz Farahat. "No final, sai mais barato e é essa conta que quisemos mostrar para o consumidor."
Ao que parece, a estratégia deu certo: para Duracell, que tinha 34,3% das vendas antes da crise, a participação esticou para os atuais 35,9%. As vendas da linha de escovas de dentes Oral B (adquirida pela companhia em 2005, quando da compra da Gillette) saltaram de 27% em agosto do ano passado para 29% em abril, e a marca está na liderança do mercado.
A divisão de cuidados com os dentes, aliás, será um dos focos da empresa neste ano. "Ao contrário do que se pensa, o Brasil é um dos países em que as pessoas são mais ligadas a esse assunto", diz Charlie Pierce, presidente mundial de produtos orais da Procter & Gamble.
Enquanto o americano escova os dentes 1,7 vez ao dia, o brasileiro, segundo dados fornecidos pela empresa, escova 2,8 vezes. Se levado em conta o tempo gasto com a escovação e outros cuidados bucais, o brasileiro também ganha. O americano demora menos de um minuto escovando os dentes. O brasileiro chega a três minutos. A recomendação oficial é de pelo menos dois minutos de escovação. "Isso mostra o quanto esse mercado é promissor por aqui", afirma o executivo.
Embora dados oficiais mostrem que no Brasil o consumidor leva mais de uma ano para trocar de escova (a média mundial é de uma troca a cada 28 dias), a empresa não acredita que isso possa limitar as vendas. "É uma oportunidade de crescimento. Em nenhum outro país do mundo a adesão ao uso de escova e pasta, seguido do fio dental e do enxaguante bucal é tão alta como no Brasil", acrescenta Wayne Randall, presidente de cuidados bucais para América Latina da multinacional.
Por isso, segundo Randall, a empresa - que recentemente lançou a pasta Oral B (a linha tinha, até então, somente os enxaguantes, as escovas e os fios dentais) - vai incentivar a maior frequência da troca de escovas por meio de um trabalho com dentistas. Também vai reforçar seu mix de produtos no país com o lançamento de mais modelos de escovas elétricas. "No Brasil, as escovas elétricas têm menos de 1% das vendas. A média mundial é de 20%", diz Pierce.
Mundialmente, a empresa também pretende investir em higiene bucal por um simples motivo: o consumo desses produtos é um dos mais resistentes em épocas de recessão. "Mesmo na Europa ou nos EUA, onde a crise bateu mais forte, não houve queda nas vendas dessa linha", afirma Pierce. "Por pior que esteja a situação, ninguém deixa de cuidar dos dentes", diz. Segundo ele, as pessoas sabem que as consequências podem custar mais caro.