Fernand
Alphen
Existe um número mágico que mede o alcance de
algumas mídias, em particular as impressas. Estima-se, há muitos anos, que cada
exemplar de um jornal e revista seja lido por 3,5 pessoas em média. Esse
número, embora queiramos crer que em algum momento tenha sido comprovado, é uma
convenção. Ele serve de base para todos os cálculos e, assim, permite uma
aproximação mais realista da audiência desses veículos.
É claro que ele é discutido, pois é provável que
uma revista, por exemplo, de conteúdo adulto ou de variedades seja lida por
mais pessoas do que uma de engenharia ou de caminhoneiro. Da mesma forma que
convenções de discurso como “bom-dia” e “obrigado” são salutares ao bom
convívio social, esses multiplicadores de alcance são universais e benéficos.
No entanto, o número mágico não se aplica aos
conteúdos publicados online. Há uma lógica por detrás disso, é claro. A
internet, como mídia, está baseada num fundamento matemático: tudo pode ser
medido com exatidão. Sabe-se a quantidade de visualizações de um conteúdo, a
quantidade de visitantes únicos, o tempo de permanência dos visitantes naquele
conteúdo, etc.
A internet é uma mídia precisa. Porém, assim como
não é aceitável considerar que uma revista seja lida apenas por um único leitor
(o dono da revista), ainda que um conteúdo na internet seja lido em primeiro grau
por apenas uma pessoa (ninguém empresta seu computador ou celular), existe um
componente nunca mensurado nas pesquisas, a saber, o potencial de viralização
do meio.
É, portanto, válido aceitar que um conteúdo
publicado (ou veiculado) em um site tem um coeficiente multiplicador, na medida
em que ele pode ser facilmente difundido, seja através de um simples copy-paste
num e-mail, seja através de RSS ou reproduções automáticas. Em decorrência
disso, um mesmo conteúdo (integral, em trechos ou modificado) pode alcançar
muito mais pessoas do que simplesmente o visitante de primeiro grau
quantificado pelas estatísticas de mensuração.
É precisamente nessa qualidade intrínseca do meio
online que reside seu poder diferenciador. É exatamente aí que reside um dos
nós da audiência na Internet e, por falta de raciocínio a respeito, uma parcela
significativa do impacto de um conteúdo é expurgado de todos os cálculos.
Antes de propor uma solução (ou uma tentativa de),
é importante relativizar a comparação entre a mídia referida no início (jornal
ou revista) e a internet (em qualquer meio, jornal ou revista online, blog,
rede social, etc).
Na mídia tradicional, o que define o multiplicador
é o suporte físico do conteúdo. É uma espécie de fator da “durabilidade” do
meio. Um jornal ou revista só pode ser lido por certo número de pessoas, porque
a temporalidade é limitada. E, assim, convencionou-se que essa validade é de
3,5 leitores por exemplar.
A internet, por sua vez, é uma mídia
autorrenovável. Não existe vida útil de um conteúdo publicado online. Ele pode
perpetuar-se inumeravelmente como uma fênix.
Podemos dizer que um conteúdo online tem sua vida
útil condicionada a dois fatores: a pertinência ou simplesmente o interesse,
por um lado; e a capacidade de viralização de cada pessoa impactada, por outro.
Em relação ao primeiro, quanto mais “interessante” for o conteúdo, maior a
capacidade de reprodução. Esse é o dado intangível e impossível de mensurar.
Vai de sua criatividade, impacto, estilo, originalidade, etc. Propomos, portanto,
não nos aventurarmos em tentar quantificar tal fator, para não entrarmos em
divagações conceituais.
Quanto ao segundo, a capacidade de viralização de
cada pessoa impactada, esse sim, talvez seja possível mensurar ou convencionar.
Tomamos como base a visitação do conteúdo. É o
ponto de partida que deveria, portanto, ser multiplicado por um fator. Vamos
aceitar como referência de cálculo os número de visitantes únicos do conteúdo,
dado simples de obter.
A internet proporciona diferentes atitudes por parte
de seus visitantes. Alguns contentam-se com a interação do zapping. São
visitantes passivos, na medida em que frequentam a internet apenas e tão
somente para ler, assistir ou ouvir conteúdos produzidos por outros. Esta é a
primeira classificação de atitude.
A segunda atitude diz respeito àqueles que, além de
serem passivos, em maior ou menor grau também produzem seus próprios conteúdos
(um e-mail é um conteúdo produzido, assim como um blog, um comentário em uma
comunidade, etc.).
A terceira atitude refere-se aos que viralizam
conteúdos produzidos por terceiros, seja através de um simples copy-paste ou de
qualquer edição mais ou menos sofisticada.
A proposta aqui é, por conseguinte, encontrar a
parcela de pessoas que possuem um comportamento de “viralizadores” na internet.
Esse número não é difícil de obter. É um valor que só se mensura por declaração
dos entrevistados, mas ele é possível. Ele pode ser mensurado em clusters ou
pela média (viralizadores gerais da internet, viralizadores entre usuários de determinado
tipo de conteúdo, entre usuários de redes sociais, etc).
O segundo fator a ser pesquisado é encontrar ou
estimar o número de contatos de cada pessoa. Ou seja, o número médio de pessoas
com os quais cada indivíduo se relaciona na internet. Mais uma vez, o resultado
pode variar de acordo com o tipo de cluster, número de contato gerais médio da
internet ou em determinada rede, o que também pode ser obtido facilmente e de
duas maneiras: por declaração em pesquisa ou por informação do cluster estudado,
quando se trata de uma rede social, por exemplo.
Se multiplicarmos a porcentagem de pessoas que
viralizam conteúdo pelo número médio de contatos, podemos obter um aceitável
multiplicador de visitantes.
É claro que nesse número estão expurgados os graus subsequentes,
mas é mais razoável ater-se ao primeiro grau: já que procuramos estabelecer uma
convenção, é prudente encontrar um número bastante conservador.
Para fins comparativos, é possível também
estabelecer diferentes convenções para cada tipo de categoria em que se insere
o conteúdo: o potencial de viralização de uma rede social, por exemplo, é
certamente maior do que o de um portal, para categorizar em apenas dois grupos.
Para ficar ainda mais fácil de entender o
princípio, vamos a um exemplo:
Digamos que determinado site da categoria “portal”
tem 1.000 visitantes únicos por mês. O número médio geral de “viralizadores” é
digamos 20%, e o número médio geral de contatos é 20. Portanto, a audiência
desse site é de 1.000 + (1.000 x 20% x 20) = 5.000. O multiplicador
convencionado de um “portal” seria, portanto, 5.
Se esse
mesmo conteúdo estiver inserido em uma rede social com o mesmo número de
visitantes únicos, teremos um cálculo de audiência diferente, já que há um
número maior de viralizadores entre aqueles que pertencem a redes sociais,
assim como é maior o número médio de contatos desse ambiente.
Por
exemplo, se o número de viralizadores é de 40% em redes sociais e o numero médio de
contatos for 50, a audiência desse conteúdo passa a ser 1.000 + (1.000 x 40% x
50) = 20.000. O multiplicador convencionado de uma rede social seria, assim, 20.
Esse cálculo pode fazer toda a diferença para
efeitos comparativos do impacto potencial de um conteúdo publicado em uma
determinada mídia online e outra. Ainda, esse número pode ajudar a parametrizar
a internet na mesma lógica de outras mídias tradicionais.
A presente proposta é, evidentemente, uma ideia;
entretanto, já é mais do que tempo de nos debruçarmos sobre esse tema, para não
corrermos o risco de continuarmos considerando a internet uma mídia misteriosa
e de difícil apreensão.
Dessa forma, quanto mais cedo criarmos essas
convenções, mais rápido poderemos converter inteligências para um cenário de
mídia que a cada dia cresce em complexidade.
Finalmente, o número multiplicador resolve apenas
parte do problema, uma vez que a lógica da internet como mídia deve continuar a
ser alvo de estudos e raciocínios próprios. Devemos cessar de raciocinar com
adaptações acochambradas, imprecisas, e míopes, ou o controle fundamental das
ferramentas de mensuração inviabilizará definitivamente o mercado editorial e
publicitário tradicional.
Ou tentamos desatar os nós, por mais inexatas
que pareçam essas tentativas, ou a esfinge nos engolirá.