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segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Quer entender o consumo? Estude a cultura!

Marcos Hiller
23 de outubro de 2013
Só no Brasil fogão tem tampa. No sul do Brasil, uma parcela da população come pizza com maionese. No Rio de Janeiro, se tem o hábito de colocar catchup na pizza. Peça catchup numa pizzaria tradicional da cidade de São Paulo para você ver a olhada de repressão que o garçom te dará. Em algumas regiões do Nordeste se tem o costume de comer catchup no meio do feijão com arroz. Só no Brasil, alguns carros modelo SUV, como a EcoSport, por exemplo, possuem aquele pneu do step afixado na traseira do veículo à mostra para os demais motoristas da rua verem e, geralmente, envolvidos com capas estilizadas ou até personalizadas.

Só no Brasil máquina de lavar tem a abertura na parte superior e, geralmente com tampa de vidro, para a dona de casa brasileira poder ver a roupa revirando pra lá e pra cá, limpando e lavando. Há quem diga que uma parcela de pessoas que usam dentadura no estado de Mato Grosso do Sul tem o costume de colocar aparelho dentário na dentadura, justamente para que o fato de possuir aparelho tente negar a existência de uma prótese dentária. No Brasil, a cor do luto é o preto e no Japão a cor do luto é o branco (vi isso outro dia numa cena de funeral em um dos filmes do Bruce Lee).

Todos esses fatos, por mais esquisitos e até mesmo pitorescos que possam parecer, se dão fortemente por conta de um elemento chamado cultura. Estudar marketing, comunicação, branding e práticas do consumo em geral nos requer cada vez mais, na contemporaneidade, que compreendamos a cultura do consumidor. E o que é a cultura? Nada mais é do que esse acervo de conhecimentos que modela e modula boa parte das relações entre as pessoas. Cultura é aquele elemento central formado por uma mistura de questões sociais, econômicas, políticas de um determinado grupo.

É na cultura onde encontramos as respostas mais profundas para desafios e dilemas do processo de marketing hoje em dia. Ferramentas mercadológicas, teoremas de Paretto, cinco forças de Porter, teorias de estratégia competitiva, os exaustivos quatro “pês” de marketing, entre outros modelos são fundamentais para entender os processos de marketing e consumo em dia? Acho que sim. Mas quer compreender um pouco mais a fundo as verdadeiras motivações, desejos e comportamentos das pessoas? Vá estudar a cultura. Tire o snorkel e coloque o tubo de oxigênio. Mergulhe. E nada melhor do que se ancorar em outras áreas do conhecimento.

Vamos com outro exemplo! Recentemente um amigo que trabalha na área de pesquisa de mercado da Kibon/Unilever me disse que fizeram algumas seções de pesquisa, por meio da técnica de grupo focal (ou focus group, como habitualmente se fala no mercado), com grupos de crianças para se detectar novas cores de picolé que a Kibon deveria lançar no Brasil. E após as discussões com a criançada, quais foram as cores preferidas? Rosa? Laranja? Vermelho? Verde? Amarelo? Azul? Quem respondeu alguma dessas, errou. A cor favorita da molecada foi o preto. Sim, um picolé de cor preta. Absolutamente imprevisível e inusitado. E se lançarmos um picolé preto seria um tremendo sucesso? Eu não apostaria nisso. E justamente por isso que esse negócio chamado pesquisa é tão fascinante.

Mas por que o preto? Confesso que não sei a razão exata. Precisaria me aprofundar um pouco mais para encontrar respostas críveis. Mas acredito que a razão do porquê o preto foi a cor vencedora não esteja no marketing, mas sim na antropologia, na sociologia, na psicologia, na semiótica. No chamado Neuromarketing talvez? Eu acho que também não. Aliás, não quero soar como uma percepção leviana, mas eu acho que misturar Marketing com Medicina é forçar um pouco a barra. Pra mim, mergulhar nas ciências sociais e ler autores como Nestor Garcia Canclini, Jesus Martín Barbero, Gilles Lipovetsky, Gisela Castro, Rose de Melo Rocha e Maria Aparecida Baccega tem me dado respostas bastante lúcidas para todos esses dilemas e complexidades das relações entre pessoas e marcas. Aliás, estudar mais a fundo o porquê de o preto ter sido a cor favorita das crianças na pesquisa talvez nos traga evidências sobre por que a meninas piram hoje em dia nessas bonecas vestidas de vampiras e monstros. Isso particularmente me inquieta.

Muito de minha visão nesse despretensioso texto é fruto de um curso de mestrado que estou para concluir hoje na ESPM/SP na área de comunicação e práticas do consumo. Estudamos o consumo não como consumismo, não como uma mera relação de troca entre bens e valores monetários. Discutimos o consumo não à luz de teorias clássicas de comportamento do consumidor, como a de Abraham Maslow e tantos outros. Pensamos o consumo como uma apropriação social, sinérgica e simbólica. Consumir hoje em dia é estar na sociedade. Consumir é se inscrever em algo. Consumimos o tempo todo, desde um maço de cigarros que compramos na esquina até mesmo uma lata de Coca-Cola que seguramos na mão ou uma telenovela a que assistimos. Consumimos sempre. Negar o consumo é negar que vivemos em sociedade.

Ah, por que diabos só no Brasil fogão tem tampa? Oras, por conta de uma questão cultural. Mais que isso: para a dona de casa brasileira, e só para a brasileira, por mais que a cozinha não esteja com aquele brilho impecável, o ato sígnico de se abaixar uma tampa de fogão significa: “Pronto! Missão cumprida! Posso curtir minha novela e meu maridão”.


Disponível em http://www.administradores.com.br/artigos/marketing/quer-entender-o-consumo-estude-a-cultura/73788/. Acesso em 29 out 2013.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A geração C, a fragmentação e o branding

Ana Couto
A certidão de nascimento tornou-se obsoleta para identificar o consumidor jovem. Hoje, pessoas dos 7 aos 50 anos de idade podem ser definidas desta forma - dos tweens (nome que vem de between, entre a infância e a adolescência) aos grups (redução de grown up, nascidos entre 1956 a 1971). O consumidor jovem pode estar entrando na puberdade ou lutando contra os cabelos brancos e, indiferente à idade, andar pela rua de skate, vestindo jeans rasgados, calçando All Stars e escutando Artic Monkeys no seu i-pod.

Mas existe algo que, de fato, diferencia estas pessoas. E não são seus hábitos de consumo. É a forma como eles se relacionam com o mundo. Porque consumidor jovem é bem diferente de público jovem.

Pessoas nascidas A.I. (antes da internet) e D.I. (depois da internet) operam de forma totalmente diferente. A Geração C - de content, ou conteúdo - é a primeira fornada de consumidores nascida sob a onipresença do computador e da internet. É chamada assim porque tem capacidade de produzir e veicular seu próprio conteúdo. Sua interferência na midiaesfera tem gerado e alimentado fenômenos como o YouTube, o MySpace, a Wikipedia e o iStockphoto. Por ter crescido sob a égide da internet, a Geração C tem em seu DNA uma atitude não-linear, viral, horizontalizada, moldada pela atuação na rede.

A compreensão deste novo padrão de comportamento e seus desdobramentos é crucial. Esta é uma geração equipada com cérebros digitais. Marcas que tentam acessá-la de forma analógica vão ficar para trás. Acabou o tempo de investir toda a verba de marketing numa milionária campanha de televisão. Marcas que se comunicam de forma linear simplesmente deixarão de ser registradas pelo público jovem.

Para se relacionar com a Geração C de forma relevante, as marcas precisam ser navegáveis. Devem ser percebidas como um cluster de sensações, alinhadas por uma personalidade coesa, e expressar-se através de um discurso coerente. É aí que entra o Branding, o grande alinhador da essência de marca através das inúmeras plataformas de comunicação. As marcas agora precisam engajar o público – em especial, a Geração C – por múltiplos canais e de diferentes formas: via conteúdo, entretenimento, na web e fora dela, através de experiências e sensações e, eventualmente, associadas a outras marcas. Não é à toa que o Branding, como disciplina, emergiu nos anos 90, quando a internet mudou a face das comunicações de forma definitiva.

A Geração C tem o cérebro desenhado como nenhuma outra, com sua revolucionária capacidade de editar e produzir informação. O código da comunicação mudou inteiramente a partir dela. O Branding tornou-se uma ferramenta indispensável para as empresas que precisam encarar o desafio de se sobressair no brandscape e atingir o público jovem.