Raul Adelino da Silva, de 18 anos, passa os dias conectado ao Orkut enquanto trabalha como atendente de uma lan house em Heliópolis - bairro pobre da cidade de São Paulo. "Uso para me comunicar com meus amigos e fazer trabalhos de escola", afirma Silva, que é aluno do terceiro ano do ensino médio. Ele tem 280 contatos na rede social.
A fisioterapeuta Juliana Suher, 26 anos, acabou com
sua conta no Orkut há menos de um mês. "Não tinha muito mais o que fazer
ali. Depois que o Facebook chegou, com mais recursos, fui deixando de
usar", diz. Como quase todos os seus amigos já eram adeptos do Facebook,
foi ficando mais fácil entrar em contato com eles por meio dessa rede. "Às
vezes, eu mandava uma mensagem pelo Orkut e as pessoas não respondiam. No
Facebook, o retorno vem em cinco minutos", afirma.
Raul e Juliana são personagens de um fenômeno bem
brasileiro. Como milhões de jovens, eles compartilham o gosto pelas redes
sociais. Mas suas preferências revelam mais que gosto pessoal. Para
especialistas, a polarização entre os dois sites de relacionamento mais
populares do Brasil refletem, à sua maneira, a divisão sócio-econômica do país.
Primeira rede social a desembarcar no Brasil, o
Orkut é a porta de entrada para novos internautas brasileiros - e, por isso
mesmo, atrai usuários da emergente classe C. Dotado de recursos mais
sofisticados e alcance internacional, o Facebook está se consolidando como a
rede favorita dos brasileiros de classes A e B. Muitos deixaram de usar suas
páginas no Orkut, do Google, para se concentrar no site criado por Mark
Zuckerberg.
Sondagem feita pela empresa de pesquisas QualiBest,
a pedido do Valor, revela que a esmagadora maioria dos internautas
brasileiros presentes nas redes sociais mantém perfil no Orkut: 91%. A adesão
ao Facebook, porém, é maior entre os mais ricos (78%), enquanto o Orkut é
apontado como o site de relacionamentos preferido por 66% da classe C.
"Os usuários de classe A, que chegaram
primeiro às redes sociais, continuam no Orkut, mas começaram a usar outros
sites, como Facebook e Twitter ", afirma Fábio Gomes, diretor técnico da
QualiBest. "Quem chegou depois ainda usa muito o Orkut e o vê como
ferramenta de comunicação."
A simplicidade das ferramentas e a existência de
uma comunidade local mais ampla são apontadas pelos usuários como as vantagens
do Orkut. Entre os adeptos do Facebook, a preferência recai sobre a diversidade
de recursos e as facilidades para interagir com as pessoas ou fazer
comentários.
Para o montador de carros Edvan dos Santos
Ferreira, 36 anos, as redes sociais são uma forma de matar a saudade da
família, que vive na Bahia. Ele está no Facebook desde o ano passado, mas diz
preferir o Orkut e o MSN Messenger - programa de mensagens instantâneas da
Microsoft - porque tem mais conhecidos nessas redes. "E também porque é
mais fácil de usar, já estou acostumado", afirma.
Adesão ao
Facebook é maior entre os mais ricos, enquanto Orkut é o preferido da classe C,
mostra pesquisa
O administrador de empresas Rodrigo Sodré aponta os
jogos on-line, a facilidade para inserir fotos e vídeos e um chat para
conversar em tempo real com os amigos como algumas das características que o
levaram a adotar o Facebook e fechar sua conta no Orkut. "Acabei
abandonando. Existem muitos perfis falsos e muita vulgaridade", afirma
Sodré, que há um ano cometeu "orkuticídio"- neologismo que expressa a
decisão de cancelar a conta na rede.
O Google minimiza esse movimento. "O Orkut é
usado por 91% dos internautas no Brasil. O que se vê é que alguns usuários
estão testando outras redes sociais, mas continuamos muito fortes", afirma
o gerente de marketing para o Orkut no país, Valdir Leme. De acordo com o
executivo, o número de visitas ao site permanece igual e não houve mudanças nos
planos das empresas de usar a rede social como espaço para publicidade. O
Google já vendeu todos os anúncios previstos para ser divulgados neste ano na
página de saída (logout) da rede social.
Leme afirma que o perfil dos usuários é muito
similar ao perfil dos espectadores da novela das 9, com uma grande variedade de
classes sociais e idades. Segundo ele, recentemente houve um forte crescimento
no número de usuários provenientes da classe D. Os números, no entanto, são
mantidos em sigilo.
Os brasileiros representam a maior comunidade do
Orkut: são 32 milhões num total mundial de 85 milhões de usuários.
Procurado, o Facebook informou que não divulga
informações sobre seu desempenho em cada país. A rede social é, de longe, a
mais usada no mundo, com mais de 600 milhões de perfis ativos.
Na avaliação de Sean Browning, diretor de parcerias
para a América Latina da Webtrends - fornecedora de softwares que medem o
impacto de ações de marketing na internet - a divisão social dos sites de
relacionamento segue a tendência de adoção de outras tecnologias no Brasil. A
existência de recursos mais sofisticados no Facebook atrai, inicialmente, quem
já está mais familiarizado com tecnologia. "O Facebook está investindo
para sofisticar e centralizar todo tipo de atividade on-line em seu ambiente, e
isso naturalmente atrai outro tipo de público", diz.
Uma das chaves para entender a segmentação social
nas redes está no tipo de ferramentas que elas oferecem, diz Rafael Kiso,
sócio-fundador da Focusnetworks, agência especializada em marketing nas redes
sociais. Segundo ele, o Orkut oferece menos recursos para o controle da
privacidade. É possível navegar e deixar comentários na página de qualquer
pessoa, mesmo que ela não esteja na rede de amigos. "Os mais ricos se
sentiram acuados com isso", avalia o executivo.
A popularização das redes sociais, no entanto,
parece inexorável e não vai se restringir ao Orkut. "Hoje, a internet é
classe C", observa Kiso.