Sylvia
de Sá
Tudo é luxo para a classe C. Pelo menos é o que diz
uma pesquisa realizada pela Franceschini Análise de Mercado para conceituar o
tema abordado no livro Luxo for All, de José Luiz Tejon, Roberto Panzarini e
Victor Megido. O levantamento teve como objetivo registrar o que os
consumidores emergentes pensam do luxo e indicar caminhos para as empresas que
desejam aproveitar o potencial deste segmento.
Marcas como C&A, Riachuello, Carrefour e Marisa
foram algumas das mais citadas pelos entrevistados. O estudo, no entanto,
indicou que 64% dos consumidores da classe C não têm nenhuma marca de vestuário
na memória que esteja ligada a luxo, assim como 62% também não citaram uma loja
específica. Os números indicam as oportunidades para as empresas que souberem
encantar esses clientes.
Apesar do mercado vivenciar movimentos de
companhias como O Boticário, que lança a marca de cosméticos Eudora investindo
principalmente em venda direta para atrair um público diferente da marca mãe,
poucas são as companhias que entenderam a necessidade de oferecer o “luxo” que
a classe C deseja. Outro exemplo recente é o de Marisa, que lançou a bandeira
Marisa Lingerie, sem mudar o foco na classe C, com pontos de venda que
pretendem oferecer a melhor experiência de compra possível, orientação e
produtos diferenciados.
Metade não associa luxo à ostentação
Em muitos casos, é preciso repensar a estratégia
das companhias ou, até mesmo, criar novas marcas, como fez O Boticário. “As
empresas terão que desenhar outro tipo de negócio. Casas Bahia e Marabraz são
redes que ficaram enormes respeitando o consumidor, com outra forma de
cadastro, de lidar com o cliente, tratar o atraso e abdicar dos juros. Uma
atitude às vezes mais respeitosa”, diz Adélia Franceschini, sócio-diretora da
Franceschini Análise de Mercado.
Segundo a pesquisa, no entanto, apenas metade dos
entrevistados associam o luxo à representação social do status e da opulência,
chamado pelos autores de opolux. O resultado mostra que o caminho para as
marcas que querem ser consideradas como luxo para estes consumidores é investir
também no lado comportamental e no estilo de vida, e não apenas no material e
na ostentação.
Do total, 25% não souberam definir o que seria luxo
para si. Já 17% citaram o egolux, luxo íntimo, baseado numa escolha subjetiva,
como uma boa casa, contas pagas e poder descansar. Outros 6% citaram ainda o
luxo filosófico, que valoriza elementos como a consciência, o desapego, o bom
gosto e ter saúde. Mas, para 27% deles, luxo é ter um bom carro, poder viajar,
ter conforto e ir a um restaurante com a família, o poplux.
Excelência, Estética, Experiência e Ética
E é no poplux que reside a oportunidade de
reposicionamento e estratégia das marcas. “O luxo para a classe C é quase a
idealização de uma vida confortável. Esses consumidores têm uma realidade tão
oprimida por necessidades básicas, que luxo é a ideia de uma casa boa, um carro
novo, entrar no supermercado e comprar de tudo um pouco. Coisas absolutamente
adquiridas pela classe média, mas que na classe C passam a ser um sonho, algo
quase inatingível”, acredita Adélia.
Por isso terão destaque as marcas que conseguirem
tocar minimamente no ideário da classe C. A estratégia deve ter algum ponto de
contato com este consumidor. Esta é a diferença entre redes como Carrefour e
Walmart, por exemplo. “O Walmart não tem traço de percepção da classe C. Talvez
por ser uma rede mais recente, ter um nome estranho para o brasileiro, pela
própria estratégia de comunicação, a localização e todos os P’s de marketing
que pesam na percepção – ou não percepção – da marca”, ressalta a executiva.
Para as empresas que desejam praticar o “novo
luxo”, o livro – lançado pela Editora Gente – aborda os 4 E’s que podem
contribuir para a estratégia com foco nas sociedades emergentes: Excelência,
Estética, Experiência e Ética. O primeiro deles refere-se ao comprometimento
com produtos e serviços de qualidade assegurada. “Com um problema de renda
maior, os consumidores buscam produtos excelentes, corretos, que durem. Isso
vai contra a ideia de que, para a base da população, qualquer porcaria serve. O
povo está aprendendo a escolher e é necessário ter excelência”, conta José Luiz
Tejon.
A estética também é essencial, pois clientes
emergentes querem o belo, como lojas com arquitetura aconchegante e produtos
com design diferente. Já a experiência é o ponto de partida para a venda, os
consumidores devem ser acolhidos, tratados com dignidade para que se sintam
incluídos. Por fim, a ética é fundamental para garantir um relacionamento
sustentável, duradouro e buscar conexões de longo prazo entre marca e cliente.
Novos 4 P’s
Na abordagem do luxo para a classe emergente, os 4
P’s também mudaram. De acordo com o conceito do livro, os executivos devem
levar em conta os novos 4 P’s. São eles Pessoas, Paixões, Produtos Cultuados e
Pontos de Encontro. “Pessoas”, porque o olhar de atendimento deve ser outro,
conter uma visão humanista, antropológica, compreendendo que, mais do que um
consumidor, existe uma pessoa com anseios, angústias e desejos, que espera ser
atendida.
A “Paixão” é o que vai engajar os clientes. As
empresas devem ser apaixonadas pelo que fazem de melhor para transformá-lo em
algo importante para as demais pessoas, envolvê-los na causa, seja na produção
de bens de consumo ou na prestação de serviços. Consequentemente, os produtos
devem ser cultuados, representar satisfação e cultivar o crescimento da
autoestima de quem os consome.
“É preciso colocar os produtos em
situações inteligentes de merchandising, como eventos. Eles devem fazer parte
da cultura e dos valores humanos que precisam ser trabalhados pelas marcas. Já
o último P refere-se ao entendimento de que as lojas, muito mais do que vender,
são pontos de encontro. As pessoas marcam casamentos em unidades da Apple.
Produtos, serviços e lojas são pontos de relacionamento que cultivam redes
físicas ou virtuais”, explica Tejon.