Frederico Goulart
16/04/14
Nosso cérebro pode começar a “ratear” bem mais cedo
do que se imaginava. Normalmente associado à idade avançada, o declínio
cognitivo do órgão pode se iniciar até na casa dos 20 anos: 24, mais
exatamente. Essa foi a conclusão de um novo estudo realizado por cientistas da
Universidade Simon Fraser, no Canadá. O trabalho foi publicado na revista
científica “PLoS ONE”.
Para chegar a essa constatação, os pesquisadores avaliaram
3,3 mil voluntários cujas idades variavam entre 16 anos e 44 anos. Eles
participaram de um jogo, em tempo real, desenvolvido pela equipe de pesquisa,
que simulava situações reais do cotidiano. A concentração dos candidatos foi
posta à prova com tarefas de múltipla escolha e também com questões de longo
prazo e mudanças de foco. Assim, foram analisadas as relações entre a idade e a
velocidade com que tomamos decisões e mudamos nossas tarefas.
O jogo procurava retratar situações comuns ao nosso
cotidiano. O desempenho dos jogadores foi gravado e analisado posteriormente.
Como era de se esperar, a velocidade com que as decisões
eram tomadas foi se reduzindo com o avançar da idade. Mas a queda no desempenho
não demorou: começou a ser detectada já aos 24 anos. Para quem acha que sabe
tudo, é bom ficar de olho. O estudo demonstrou que, após essa idade, a cada 15
anos, o ritmo cognitivo cai cerca de 15%. E não tem chororô: segundo os
responsáveis pelo estudo, ninguém ficou de fora, nem mesmo os jogadores que
conseguiram se aprimorar na execução das atividades do jogo. O declínio
cerebral permaneceu mesmo entre aqueles com mais habilidade de jogar.
Na avaliação do neurologista Fabrício Hampshire, professor
da Faculdade de Medicina de Petrópolis, os resultados sinalizam que o processo
de declínio cognitivo é dinâmico e se inicia muito antes da chamada terceira
idade. Mas ele também entende que os dados precisam ser relativizados.
— A perda neuronal começa bem antes dos 60 anos, mas novos
neurônios também surgem constantemente. Do ponto de vista clínico, essa
informação não gera nenhuma intervenção prática ou necessidade de medidas
preventivas além das que já conhecemos. As publicações cientificas devem sempre
ser analisadas com critério para que precipitações sejam evitadas — avalia.
O especialista também lembra que a morte de neurônios é um
processo contínuo que piora com o tempo e acontece mais rápido na presença de
doenças específicas, como o Alzheimer.
Sedentarismo, o grande inimigo da cabeça
Por outro lado, o envelhecimento cerebral precoce não seria
devido ao estilo vida moderno, que nos expõe constantemente a estímulos por
meio de computador, internet, celular e televisão? Fabrício descarta a
hipótese.
— À luz da ciência, o que pode interferir na prevenção do
processo é a prática de atividade física regular, de pelo menos 150 minutos por
semana, e do exercício do cérebro, por meio da leitura — afirma o
neurocientista. — O sedentarismo faz muito mal aos neurônios. Além disso, o
tipo de dieta alimentar que temos e a quantidade de horas de sono também
interferem. O estresse psicológico e a presença de doenças como a hipertensão e
o diabetes influenciam diretamente no problema.
Osvaldo Nascimento, professor do Departamento de Neurologia
da Universidade Federal Fluminense (UFF), concorda:
— Aspectos de ordem social, problemas afetivos, trânsito
engarrafado: tudo isso determina o comportamento do nosso cérebro — descreve.
O especialista explica que, na casa dos 20 anos, nosso corpo
começa a se expor a uma espécie de curva biológica:
— Todo o nosso organismo sofre uma queda de produção. Não é
diferente com o sistema nervoso. Ocorre um declínio da atividade dos nervos
responsáveis pela transmissão de estímulos. É algo normal.
Com o declínio, funções responsáveis pelas decisões ou pelo
reconhecimento de pessoas ou histórias são prejudicados. Mas calma, nem tudo
está perdido só porque chegamos aos 24 anos. O estudo canadense também observou
que, com a redução da velocidade cognitiva, o cérebro compensa o déficit de
várias formas. Baseando-se na experiência, ele antecipa de maneira precisa
futuras tarefas e cria atalhos mentais que permitem eliminar informações
irrelevantes.
Disponível em
http://oglobo.globo.com/sociedade/saude/cerebro-humano-fica-mais-lento-partir-dos-24-anos-aponta-estudo-12213203.
Acesso em 21 abr 2014.