Ricardo Voltollini
A esta altura, você já dever ter lido em revistas de negócio uma daquelas típicas matérias contendo receitas infalíveis de como ser um profissional mais bem-sucedido ou um líder melhor no ano que se inicia.
Mesmo que superficiais, elas sempre ajudam no mínimo a agendar uma reflexão tantas vezes adiada na correria do dia a dia. Mas, para além das dicas técnicas e comportamentos recomendados que certamente você já anotou em sua agenda de 2012, gostaria de acrescentar, a título de nova reflexão, um recado menos óbvio: o exercício da solidariedade fortalece a musculatura do seu potencial de liderança.
Acabo de voltar de Barcelona, onde tomei contato com um estudo muito interessante feito por Nicola Pless e Thomas Maak, professores da Esade Business School, uma das mais importantes escolas de negócios do mundo. Pless e Maak entrevistaram 70 executivos dos EUA, América Central, Europa e Sudeste asiático, todos eles integrantes de um programa de desenvolvimento de liderança da Pricewaterhouse Coopers, chamado Ulysses.
Os participantes são estimulados a trabalhar durante dois meses em projetos na Namíbia, Quênia, Camarões, Zâmbia, Madagascar e Gana e não há lucro em jogo. No lugar de construir negócios, eles são desafiados a colocar conhecimento e talento a serviço de causas como a redução da pobreza, saúde e preservação ambiental. Sem os times remunerados e as estruturas montadas com que costumam contar nas companhias, eles têm de agir com apoio de ONGs, empreendedores sociais e organizações internacionais.
A principal conclusão geral dos pesquisadores
O contato direto com situações de pobreza transforma profundamente o estilo de gestão dos líderes e melhora substancialmente suas habilidades de liderança, de tal modo que eles retornam à empresa muito melhores. Os resultados chamam a atenção.
Para 95% dos integrantes, participar de um programa como esse implica enorme ganho de conhecimento a respeito de temas socioambientais e de saúde. Nove em cada dez (91%) deles afirmam ter saído da experiência mais conscientes da grande responsabilidade de executivos de empresas frente aos dilemas socioambientais do mundo; e 85% entendem que se tornaram líderes mais flexíveis, empáticos e sociáveis na medida em que melhoraram suas habilidades interpessoais e de comunicação.
E mais: 82% dos executivos entrevistados admitem que viver os desafios de um País em desenvolvimento os tornou líderes mais sensíveis para a importância das relações e das amizades. Ainda na mesma linha de raciocínio aquisitivo, surpreende o fato de que mais da metade (54%) diz ter reduzido preconceitos e aprendido a evitar julgamentos sobre pessoas. Eis aí uma competência emocional importante.
Segundo a professora Nicola Pless, o estudo indica que, no retorno à empresa, todos os participantes se mostram socialmente mais responsáveis, respeitosos e tolerantes. Além disso, também desenvolveram determinadas atitudes de liderança, com nova postura ética, valores mais fortes e uma mentalidade global.
Experiências de trabalho em equipe em países pobres impactam direta e profundamente o autodesenvolvimento.
“Os líderes envolvidos tornam-se mais conscientes de suas limitações pessoais e suas necessidades de desenvolvimento. Aprendem a ser humildes, encontram um propósito de vida mais profundo, ficam mais conscientes da importância das relações e sentem maior necessidade de equilibrar trabalho com vida pessoal.”
As conclusões desse estudo espanhol confirmam uma convicção antiga. No meu livro “Conversas com Líderes Sustentáveis: o que aprender com quem fez ou está fazendo a mudança para a sustentabilidade” (SENAC-SP, 2011) ressalto que líderes empresariais têm muito a aprender com outros líderes que enfrentaram, com sucesso, desafios nos campos social e ambiental.
O que se vê hoje
Não por acaso, tenho observado dois fenômenos curiosos e até certo ponto surpreendentes. Com a inserção do conceito de sustentabilidade na gestão dos negócios, cada vez mais as empresas começam a recrutar para seus quadros os profissionais que estavam a serviço de seus institutos e fundações, porque enxergam neles competências de liderança como as descritas no estudo da Esade Business School, crescentemente mais valorizadas.
Cada vez mais, líderes de negócios importantes começam a enviar seus jovens executivos à linha de frente do relacionamento com comunidades, para que eles aprendam a conviver com opiniões contrárias, a lidar com conflitos, a ouvir os pontos de vista dos públicos impactados pelos negócios e a se colocar no lugar dessas pessoas.
Se você ainda não pensou nisso, é hora de pensar.
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