Marcelo Brandão
Segundo estatísticas do IBGE, no ano 2000, 30% dos brasileiros tinham de
zero a 14 anos, e os maiores de 65 representavam 5% da população. Em 2050,
esses dois grupos etários se igualarão: cada um deles representará 18% da
população brasileira. Se em 2000 o Brasil tinha 1,8 milhão de pessoas com 80
anos ou mais, em 2050 esse contingente poderá atingir os 13,7 milhões,
representando um crescimento em torno de 4,16% ao ano.
A expectativa de vida dos mais velhos, segundo o mesmo levantamento,
será de 81,3 anos em 2050. Nessa toada, vivendo mais e melhor, a terceira idade
passa a ser um nicho de mercado muito interessante para empresas de diferentes
segmentos.
Números que, além de traduzidos em um enorme potencial de vendas, podem
se tornar uma interessante fonte de mão de obra. Se compararmos a taxa de
atividade profissional das mulheres idosas brasileiras com a de países
europeus, por exemplo, vemos que o Brasil, México e Argentina se destacam com
uma taxa em torno de 20%. Um cenário que não deixa dúvidas para a valorização
dessa parcela da população.
Pensando nas diferenças
Não investir no atendimento adequado, na criação de produtos e inclusive
postos de trabalho, pode ser um erro fatal para empresas e comércio. Um bom
exemplo dessa visão otimista de mercado pode ser notado na linha de calçados da
loja Perere de São Paulo. A loja foi pioneira no ‘comfort shoes’ no Brasil, uma
linha de calçados pensando especialmente na terceira idade – que representa,
atualmente, 40% dos clientes da loja.
Segundo Patrícia Guedes, proprietária da loja. o conceito de ‘comfort shoes’
surgiu há 17 anos quando ela sentiu falta de ter aqui no Brasil, marcas de
calçados de conforto – conceito já bastante difundido na Europa. Assim, a
empresária decidiu inaugurar a primeira loja desse tipo de calçados no País.
A princípio ela trabalhava somente com marcas importadas. Hoje o
portfólio se expandiu e devido à procura, a loja começou a trabalhar com
calçados de marca própria também.
“O consumo desse tipo de calçados é alto. Pelo público feminino ainda é
maior, mas os homens também compram, entretanto, com mais moderação e
parcimônia”, explica Patrícia sobre sua cartela de clientes.
Turismo
Só no Estado de São Paulo 63% dos idosos viajam, no mínimo, uma vez por
ano. O turismo da terceira idade já movimenta R$ 20 milhões por ano no Brasil.
Para a maioria das agências de turismo do País este público representa, hoje,
em média, 25% das vendas.
A maioria utiliza portais de vendas online, onde oferecem uma grande
variedade de destinos e serviços. Os destinos internacionais e os de cunho
religioso vem em primeiro lugar. Os nacionais têm como carro chefe as cidades
do nordeste brasileiro, seguido do sul do País.
Para Antonio Torino Neto, diretor comercial da agência Vamos Turismo, o
período de maior procura deste público é “fora da temporada”, já que nas
temporadas, eles se equivalem às férias da grande maioria e portanto, são muito
visitados pelos familiares (filhos e netos).
Para Torino este público adora viajar e quer se sentir seguro na hora da
compra e serem tratados com dignidade e muita educação. “Eles estão voltando a
ser crianças novamente, porém com um poder de escolha bem mais apurado e com as
condições de negociação muita aguçada. Oferecer um serviço de qualidade, com
excelência e se possível, demonstrar a satisfação dos que já utilizaram, faz
toda a diferença”, comenta Torino.
Para o setor de turismo o mercado vem crescendo e quem tiver a
sensibilidade para tratar este nicho de consumidores terá um diferencial de
receita muito grande nos próximos 10 ou 15 anos. “A grande dificuldade que
encontramos hoje é a de sensibilizar as cadeias que são os fornecedores de
serviços. Atualmente é difícil encontrarmos tarifas já preparadas para este
mercado e quando solicitamos nem sempre elas vêm com a base tarifaria que o
governo orienta”, comenta Torino sobre as dificuldades que o setor de turismo
brasileiro enfrenta para se equiparar aos mercados internacionais.
Parcela produtiva
Um público que viaja mais vive mais e com mais qualidade, é também um
público produtivo. Foi pensando assim, que algumas empresas tomaram iniciativas
para valorizar e ajudar na inclusão dessas pessoas no mercado de trabalho.
A rede Pizza Hut, da Grande São Paulo, por exemplo, há sete anos criou o
“Programa Atividade”, projeto que proporciona emprego e renda para
profissionais com mais de 60 anos.Já passaram pelo programa 200 pessoas e,
atualmente 10%, do quadro de funcionários da rede são desse faixa etária.
“Fortalecemos a nossa equipe com cidadãos que possuem a experiência dos mais
velhos, mas a mesma vontade de superar os desafios dos mais jovens” cita
Reynaldo Zani, gerente geral da Pizza Hut SP. Só neste ano a rede abriu mais 50
postos de trabalho para estes profissionais.
Pioneira no Brasil na avaliação do atendimento ao consumidor, por meio do
“cliente secreto”, a Shopper Experience é outra empresa que investe nessa
tendência.
Para Stella Kochen Susskind presidente do grupo, “o mercado brasileiro
ainda trata o consumidor com mais de 60 anos como um consumidor invisível”. Não
convencida que empresários e gestores brasileiros estariam atentos a este
gargalo, a empresa decidiu criar o projeto “Peritos da terceira idade”.
No projeto a empresa recruta maiores de 60 anos de todo o Brasil dando a
eles uma oportunidade de trabalho e, ao mesmo tempo, analisa o atendimento aos
clientes em idade avançada. O grupo é formado por profissionais liberais,
aposentados e donas de casa, que representam hoje, 3% da base de pesquisadores
da empresa. “Trata-se de um levantamento criterioso e amplo, que mostra aos
empresários o dano financeiro e social causado por um atendimento equivocado”,
explica Stella.
Uma iniciativa valiosa que ajuda o mercado a entender os anseios deste
cliente e alerta o empresário na redução de perdas nas vendas, além de
antecipar produtos e serviços que podem potencializar seu desempenho no futuro.
“Além disso, queremos fomentar o mercado de trabalho para os idosos. Estamos
comprometidos em propagar o ‘consumo inclusivo’ – um modelo em constante
evolução que acompanha a transformação da sociedade e dos consumidores”,
argumenta Stella.
Informação adequada: consumidor fiel e satisfeito
As mídias televisiva e impressa continuam sendo os canais mais
utilizados pelo idoso na hora de conhecer seus direitos. Alguns, já arriscam a
navegar pela internet para se atualizarem sobre estas informações, mas ainda é
uma parcela tímida.
Segundo a advogada Fabíola Meira, falta esclarecimento e atendimento
adequado para fidelizar este consumidor. “Os idosos, assim como a população em
geral, tem manifestado mais interesse na busca de informações sobre o que está
correto ou não no mercado de consumo, na publicidade, nas ofertas, etc. No
entanto, os idosos ainda não conseguem exercer este direito plenamente, sendo
obrigados a recorrer ao Poder Judiciário ou aos órgãos de proteção e defesa do
consumidor. Isso se deve em boa parte, aos muitos fornecedores que não
demonstram preocupação em ouvir suas dúvidas, sugestões ou reclamações”, afirma
a advogada.
Para ela, a única forma do Código ser respeitado e dos fornecedores
terem fidelizados esta classe de consumidor é o cumprimento disposto na
legislação no tocante à informação (clara, ostensiva, com letras grandes, em
língua portuguesa, que não induzam em erro ou equivoco quanto aos dados
essenciais). “Os principais problemas estão na disposição das informações no
comércio em geral. As diferenças entre preço à vista e preço parcelado, taxa de
juros, diferença de preço nas diversas modalidades de pagamento ou de cartão,
são alguns exemplos”.
É imprescindível que os fornecedores estejam atentos a isso. Ignorar um
atendimento diferenciado é ledo engano. Muitos idosos apresentam alto poder
aquisitivo e, por consequência, poder de consumo.
A vulnerabilidade, natural em razão da idade e das conseqüências desta
fase da vida, leva à falta de compreensão de muitos aspectos no momento da
compra ou da contratação de serviços.
Assim, se fornecedores e gestores tiverem pleno conhecimento destas
deficiências e alterarem a forma de atendimento para este consumidor, ao mesmo
tempo em que estarão cumprindo o Código de Defesa do Consumidor e visto com
bons olhos pelos órgãos de proteção e defesa e pelo Poder Judiciário,
certamente terão clientes satisfeitos, fidelizados e seguros.