Lilian Calmon
13/11/2013
A semiótica tem papel fundamental para a compreensão das
transformações pela qual o Marketing está passando. Com o ambiente em rede e as
mídias sociais, a relação do consumidor com a marca não é mais única. Ela faz
parte de diferentes relacionamentos das pessoas e, por isso, é importante
entender os mecanismos sociais que desenham os significados conferidos pelas
pessoas. Atualmente, tudo é proclamado novo sem necessariamente carregar alguma
novidade.
O estudo da semiótica como ferramenta para entender as
transformações do Marketing é a proposta do livro “A Inovação em Discursos
Publicitários – comunicação, semiótica e marketing” escrito por João Ciaco,
Diretor de Publicidade e Marketing de Relacionamento da Fiat Automóveis para o
Brasil e América Latina, e publicado pela Estação das Letras e Cores. Com 20
anos de trabalho na área, ele escolheu voltar ao doutorado na Pontifícia
Universidade Católica (PUC-SP) para dar conta das suas inquietações diante de
um mundo cada vez mais fragmentado. Ciaco foi buscar o sentido disso na
construção de produtos, marcas e estratégias de Marketing.
Na obra, são abordadas as etapas do processo semiótico que
constroem o discurso da novidade a partir de elementos textuais, imagéticos e
gráficos da comunicação contemporânea de automóveis. “Os carros são novos todos
os anos e, no fundo, eles mudam muito pouco. A essência não muda. São discursos
para demarcar o tempo hoje, que é esse momento que todos nós conhecemos. Qual é
o sentido desse novo que está tão presente em nosso dia a dia?”, questiona João
Ciaco, Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Diretor de Publicidade e
Marketing de Relacionamento da Fiat Automóveis para o Brasil e América Latina e
Presidente da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), em entrevista ao
Mundo do Marketing. Veja a entrevista completa.
Mundo do Marketing: O livro é fruto da sua tese de
doutorado. Como foi a volta à academia?
João Ciaco: Na verdade, o mais importante é que com 20 anos
de trabalho na área de Marketing, voltei para o doutorado, porque percebi que
os instrumentos que temos disponíveis não conseguem dar conta dessa realidade e
das transformações do novo consumidor e das novas mídias. Há uma série de
elementos que faz com que precisemos de novas ferramentas para fazer melhor
aquilo que já fazemos.
Meu trabalho de doutorado não é de afastamento do Marketing
em direção à semiótica. Pelo contrário, é um aprofundamento através de
instrumentos novos que ajudam a dar conta dela como elemento agregador. Talvez
a essência disso seja a própria gestão dos elementos de sentido da marca e das
ferramentas novas. A semiótica é uma ciência da significação que consegue fazer
isso. O estudo a partir dela nos ajuda a dar conta da marca no universo
pós-moderno e contemporâneo.
Mundo do Marketing: Que transformações no Marketing você vê
hoje?
João Ciaco: Com o ambiente em rede e as mídias sociais, a
marca vai perdendo força gradativamente. Não existe mais a relação entre ela e
o consumidor unicamente. Ela faz parte de diferentes relacionamentos das
pessoas. Então, é importante entender os mecanismos sociais que desenham os
significados conferidos pelas pessoas. A semiótica é uma metodologia que dá
conta disso. Agregá-la ao fazer do Marketing enriquece o conhecimento em
relação ao consumidor.
Mundo do Marketing: Você diz que há um culto ao novo nos
discursos publicitários. O que quer dizer?
João Ciaco: Tudo é proclamado novo sem necessariamente
carregar alguma novidade.
Os automóveis são novos todos os anos, quando são relançados
e, no fundo, mudam muito pouco. A essência do produto não muda. O que fui
buscar é o sentido que esse discurso do novo traz para a construção de marcas,
produtos e estratégias de Marketing.
Não estou estudando metodologia de inovação. Não é um livro
de engenharia. É um trabalho que vai ajudar a entender como se constrói o
discurso do novo no reposicionamento de imagem, no desenho de atributos, na
valorização de determinados aspectos em detrimento de outros. A minha pergunta
é qual o sentido desse novo que está tão presente em nosso dia a dia.
Mundo do Marketing: Isso é algo recente?
João Ciaco: No mundo contemporâneo, o novo é destituído de
sentido. Ele é tão repetitivo e presente, que passa a não ter significado.
Talvez seja muito mais um demarcador do tempo para mostrar que está acontecendo
agora do que um elemento de transformação. O novo só denota que é algo
extremamente atual, sem necessariamente carregar qualquer valor de inovação, de
ruptura ou de quebra com o que existia anteriormente.
Para as empresas, é mais importante trabalhar essa
construção do discurso do que se voltar para uma estratégia de engenharia. É
mais interessante essa percepção social, cultural, antropológica ou semiótica de
inovação do que efetivamente se valer de coisas novas. Faz mais sentido se
proclamar novo e demarcar a novidade do que efetivamente ter que prová-la. Meu
trabalho é baseado na publicidade, da comunicação. O livro fala etapa por etapa
do processo semiótico para essa construção a partir de elementos textuais,
imagéticos e gráficos. Com isso, vai decupando como a inovação é construída do
ponto de vista do discurso na comunicação contemporânea de automóveis e que
sentido ela terá no fim.
Mundo do Marketing: Você pode mencionar algum exemplo
estudado na tese?
João Ciaco: Na verdade, não é um caso só: a análise é mais
ampla. O sentido maior é o automóvel, que todo ano se diz novo, mas não ter
nada diferente de 2013 para 2014. Pode ter uma coisinha ou outra de novidade. O
livro, apesar de acadêmico e voltado para os estudantes de comunicação,
interessará as pessoas que trabalham com Marketing e que talvez tenham as
mesmas inquietações que tive para fazer o doutorado. Acho que a obra ajuda a
responder alguns anseios e angústias que vivi, porque tem a ver com o dia a dia
do Marketing.
Mundo do Marketing: O IX Fórum Internacional de Mídia da
Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) realizado na semana passa teve como
tema “Tempos de evolução ou de revolução?”. Quais são os desafios atuais?
João Ciaco: O Fórum é um evento anual que reúne anunciantes
para compartilhar desafios. Um deles é como a mídia é gerida num mundo tão
fragmentado, onde a definição dela é muito mais do consumidor do que do emissor
da marca. Como é consumir nesse universo em que as amarras que fazem sentido no
que falamos são feitas pelo consumidor e não por nós? Como é tratar o poder da
marca quando ela já não o tem mais? Como é criar relevância nesse universo?
Como pensar a fragmentação das mídias e como fazer a gestão desses meios se há
tantas opções para compra? Tanto os anunciantes quanto as agências e os
próprios veículos estão procurando entender quais são as melhores práticas.
Mundo do Marketing: Em relação à produção de conteúdo, o que
você destacaria?
João Ciaco: Temos que despertar no consumidor não mais a
audiência, mas a atenção. Ele escolhe o que vai ver, em qual mídia e em que
hora. Ou seja, a decisão está nas mãos
dele. Se não criar conteúdo relevante, a marca passará totalmente despercebida.
A criação de conteúdo talvez seja uma das formas mais eficazes para fazer com
que os olhos das pessoas se voltem para o que estamos produzindo. Por isso, as
empresas estão tão preocupadas com este tema.
Disponível em http://www.mundodomarketing.com.br/entrevistas/29224/como-a-semiotica-contribui-para-as-transformacoes-do-marketing.html.
Acesso em 13 nov 2013.
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