Nastassja Fischer
03/02/2012
Existem alguns ditos populares que nos alertam que não
devemos confiar em alguém somente pela sua aparência: “quem vê cara, não vê
coração” e “nunca julgue um livro pela capa” são apenas dois exemplos. Porém,
nossos rostos dão pistas essenciais sobre como devemos agir ou o que esperar de
uma outra pessoa, como já foi, inclusive, falado em um texto aqui no blog. Por
exemplo, existem evidências que pistas faciais de medo são processadas em
apenas 40 milissegundos (ms), sendo esse tempo suficiente para gerar uma
opinião sobre a intenção de outra pessoa. Com isso, certos sinais faciais podem
ter uma influência substancial em como as pessoas avaliam e se comportam frente
a outra pessoa em uma interação social.
Uma dessas pistas que procuramos quando nos relacionamos com
alguém é a confiança. Detectar o quão confiável é uma pessoa possui uma
importância especial, a partir do momento que se pode coletar informações
importantes sobre se o indivíduo com quem estamos interagindo é alguém que
podemos nos aproximar ou evitar. Dessa forma, a detecção da confiabilidade é
essencial para a sobrevivência humana e existem um estudo que sugere,
inclusive, que o cérebro possui regiões especializadas para desempenhar essa
tarefa, como por exemplo, a ínsula e amígdala, que são regiões envolvidas em
situações onde precisamos detectar um potencial perigo ou tomar uma decisão.
Baseando-se nessas informações, um trabalho realizado na
Universidade do Arizona no Estados Unidos testou a hipótese de que o julgamento
implícito da confiabilidade de terceiros estaria relacionado com o modo que as
pessoas cooperam entre si. Para isso, os voluntários do teste participaram de
uma tarefa de interação social chamada “jogo da confiança”. Na sua versão
tradicional, existem duas funções a serem assumidas por pessoas diferentes: a
de “investidor” e “parceiro”. Ao “investidor” é dada uma quantia em dinheiro e
lhe é informado que ele tem a opção de ficar com todo o dinheiro, transferir a
quantia total que recebeu para o “parceiro” ou repartir o que ele tem da forma
que desejar. Diz-se também que o montante que for transferido será multiplicado
de 3 a 4 vezes e dado ao “parceiro”. Esse último, então, tem o papel de decidir
se vai transferir alguma parte do dinheiro multiplicado para o “investidor” e,
com isso, o “parceiro” tem a opção de honrar a confiança nele depositada ou
não.
Na versão do “jogo da confiança” usada pelos autores do
estudo, os participantes do teste poderiam assumir apenas o papel de
“investidores” e, antes do jogo começar, tinham que visualizar e avaliar, de
forma não-explícita, as faces de 79 supostos “parceiros”, com os quais era dito
que eles teriam que interagir. Posteriormente, em cada rodada do jogo, eles
tinham que decidir se iriam transferir uma determinada quantia em dinheiro para
seu parceiro sem ter nenhuma garantia de retorno, sendo esse um “índice”
implícito do quanto eles confiavam no parceiro. Ao final da tarefa, eles ainda
tinham que declarar o quanto eles confiavam nos “parceiros”.
Os resultados mostraram que a avaliação inicial de
confiabilidade feita através da visualização da foto foi uma pista altamente
influenciadora na decisão do “investidor” sobre o quanto de dinheiro ele iria
dividir ou não. Ou seja, os participantes deram mais dinheiro para aqueles
“parceiros” que eles achavam ser mais confiáveis no início do jogo, tendo como
parâmetro apenas as suas fotos. Mais ainda, o fato do “parceiro” ter devolvido
ou não o dinheiro após a divisão não influenciou na avaliação explícita de
confiabilidade pelo “investidor” no final da tarefa. Pelo contrário, parece que
o julgamento do quão confiável era o “parceiro”, realizado implicitamente antes
de começar o teste e baseado apenas na aparência do rosto, exerceu uma
influência mais forte nesse sentido.
Desse modo, pode-se observar como nós somos influenciados,
mesmo que de forma não-consciente, por pistas sociais. Também é interessante
notar como tais pistas podem afetar nossas decisões e a forma como interagimos
com o próximo. Por mais que o velho ditado diga: “Quem vê cara, não vê
coração”, parece que é na “cara” que nos baseamos para guiar qual será o
próximo passo a ser tomado quando decidimos cooperar com alguém.
Disponível em
http://www.forebrain.com.br/voce-julga-um-livro-pela-capa/. Acesso em 12 dez
2013.
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